sexta-feira, 29 de maio de 2009

A colina do velho sentado

Observe...
O velho, vulgo filósofo, levantou-se do lugar que estava sentado já há três anos passados, no caso o alto de uma colina. Observou com olhar vago o grupo que encontrava mais abaixo do local. “Seguidores”, pensou ele. Levantou o dedo indicador para o céu e proferiu as seguintes frases:

1- Um estranho pássaro nasce de um ovo um pouco fora do comum, esse pássaro se diz melhor que os outros e realmente leva certa vantagem, sendo assim sua prole é grande e sua espécie é levada adiante.

2- Há poucas pessoas que realmente observam e entendem o mundo, que tem uma visão ampla das coisas, esses são os iluminados.

3- Por trás de tudo há sempre alguém editando as coisas do jeito que melhor lhe convêm, do jeito em que num futuro seu grupo possa estar observando tudo de cima.

4- Nada que morre se torna perpétuo. Só a vida de quem está vivo poderia ser imortal; mas não o é.

5- Conhecemos pessoas em nossas vidas que poderiam e merecem se tornarem imortais.

6- A grande lógica por trás de tudo é que os mistérios não existem, são criados pelo próprio homem para confundir o próprio homem.

7- A simplicidade da vida leva a felicidade, pensar demais leva a loucura; pensar com clareza leva a iluminação. A iluminação leva a simplicidade.

8- Um homem não pode se tornar um deus por si próprio, seus semelhantes é que podem elegê-lo para o tal.

9- A grande forma de levar uma pessoa a clareza é sempre questionar as leis do mundo e as leis do homem. Apenas as leis da natureza são inquestionáveis.

10- Ter em mente que podemos aprender muito com pessoas melhores que a gente é uma grande forma de crescimento.

11- Tudo chega a um fim, essa é uma lei da natureza. A raça do pássaro estranho está perto do fim. Temos que nos conformar com o fim das coisas e levar a vida adiante.

Após isso o velho se deitou e morreu.
Seus observadores, ou “seguidores”, claramente não entenderam nada do que o velho disse. Pois um deles era um cachorro vira-lata, o outro um bode chamado Lulu e o terceiro um estranho rato de cor verde.

quarta-feira, 27 de maio de 2009

O rato verde

É sabido que em laboratórios científicos os cientistas utilizam-se de ratos para se fazer experimentos diabólicos. E pobre dos ratos que dão suas vidas por meras curas de doenças do homem.
Certa vez, em um laboratório de uma pacata cidade interiorana chamada Jundiaí, (onde todas as noites se tem algo interessante para fazer), nasceu um rato verde. Este rato estava fadado a grandes feitos, ele lideraria todos os outros ratos na Grande Revolução Ratânea do ano de 2011. Mas essa não é a historia da revolução e nem de seus feitos heróicos. Essa é a história do fim que levou o conclamado Rato Verde.
Algumas pessoas, quero dizer, alguns ratos, acreditam que Rato Verde foi morto na ultima batalha, outros dizem que ele resolveu desaparecer nos confins da Terra, o sistema de esgoto, para viver uma vida de meditação até o fim de sua passagem pelo planeta. Alguns outros afirmam que ele virou ratoburguer e foi vendido à estudantes em frente a Politécnica. Eis aqui a verdade sobre o fim do segundo maior rato que já existiu.
Após a ultima batalha da Grande Revolução Ratânea, onde infelizmente o mal triunfou, ou seja, os homens, o líder dos ratos Rato Verde não foi morto e nem se enfiou pelos esgotos. Ele foi preso e enjaulado pelos homens e foi levado a um laboratório para estudos, pois não acreditavam que tão pequeno roedor pudesse ter uma mente incrivelmente superdotada. Não se babe ao certo o que ocorreu naquela noite em que o laboratório explodiu, mas certamente Rato Verde estava envolvido, pois ele saiu sem arranhões pela porta da frente.
Por muito tempo o famoso rato andou a ermo pelo mundo. Sempre as escondidas, ele visitava todo tipo de estabelecimentos onde se conseguia uma refeição fácil. Experimentou iguarias por todo canto. Até que um dia se cansou e decidiu procurar por uma residência fixa.
Encontrou a toca ideal em uma arvore, que pertencia a uma grande fazenda. Essa toca estava escavada entre suas raízes e oferecia um aconchegante e seguro abrigo. Pelo resto de seus dias Rato Verde viveu ali, fumando ervas em um pequenino cachimbo e filosofando sobre a vida.

domingo, 17 de maio de 2009

A ultima escrita antes do terrível fim

“Embora eu ainda não a conheça você é destinada para mim.
Estou te aguardando. Não posso dizer que estou ansioso, pois sei que um dia você virá. Nem mesmo medo de que eu não a reconheça eu tenho, acredito que verei em seus olhos o que procuro.
Posso imaginar como você é? Posso sonhar com você? Posso pensar que”

Ele pousou a caneta na mesa, pois ouviu um barulho no portão, pelo horário deveria ser sua namorada. Eles moravam juntos já há dois meses, com três nos de namoro. Apesar de gostar muito dela, não sentia que a amava intensamente. Várias vezes estava decidido a deixá-la, mas na hora H não teve coragem. Foi levando o relacionamento até onde dava, e agora decidiram viver juntos. Ele sabia que ela o amava e que se ele terminasse tudo ela sofreria muito mais que ele, e ele tinha certa pena dela, não queria fazê-la sofrer.
Ele ouviu o portão fechar e pegou novamente a caneta.

“você também me reconhecerá? Não sei como será nosso encontro e nem quando, mas sei que acontecerá. Terei eu ainda vitalidade e poder te satisfazer com meu corpo?”

A porta se abriu, não estava trancada, ele não se virou.
Ouviu seus passos se aproximarem e já imaginou ela colocando as mãos em seus ombros e sabia todas as falas da conversa que se seguiria.
Pousou a caneta novamente e se virou devagar.
Aqueles olhos não eram de sua namorada, aqueles olhos eram grandes e negros, pareciam jabuticabas; eram perfeitos.
- É você. – Disse ele. – Sabia que viria um dia.
- Sim. Você é Sebastião Rosário?
- Sou, você é perfeita.
- Obrigada.
- Aguardei por você a vida toda, hoje é um dia especial. Agora sinto que minha vida está realizada.
- Você então sente que se morrer agora terá vivido uma boa vida?
- Morrer?
- Sim.
- Bem, acho que não quero morrer agora, não antes de poder tê-la em meus braços, pelo menos por um instante.
- Isso não será possível Sebastião Rosário. É uma pena.
Ela apontou-lhe uma 9mm semi-automática com silenciador e deu dois tiros em sua testa e um no pescoço, para garantir.
Ele tombou para trás sobre seus papeis, manchando-os de sangue. Ela virou-se e partiu.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Albert Einstein at Beach*




Vamos deixar de lado essa panaquisse de querer ser inteligente.
Sejamos como ele, seguiremos o fluxo, admiraremos o mar e o céu.
Quem liga para cabelos arrumados? Nos bares da vida ninguém.
O saber vem de quem não quer ser nada além de um simples ser.


*inspirado pelo blog da Sun

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Minha meia direita

No meu tempo as mulheres tinham cabelos. Meu tempo se foi. Hoje a Colônia controla todo mundo, dizem agora que é um mundo unificado. Sem guerras, sem desigualdade. O preço da paz é a perda da liberdade, algo como a morte.
A Colônia assumiu o fardo de controlar o mundo logo após os países entrarem em crise, isso foi há muito tempo, poucos se lembram do real motivo da crise. Todos os artigos e livros escritos sobre isso desapareceram. A Colônia também controla a mídia e as editoras. Depois da crise uma guerra de proporções gigantescas assolou todo o mundo. A única solução encontrada para acabar a guerra foi entregar o controle dos governos para um único governo mundial.
O primeiro ato deles foi tomar todo o poder sobre os bancos mundiais e todas as empresas passaram a ser controladas por eles. Depois veio a igualdade social, antes havia os ricos e os pobres, hoje há apenas os pobres. Todos se vestem pobremente igual, corte de cabelo igual, sapatos iguais. Nossas casas são todas parecidas e somos praticamente escravos em nossos empregos, para ganhar a mesma coisa.
Poucos anos antes eu me rebelei à Colônia, criei a Ordem da Meia Direita. Uma ordem de guerrilha para arraigar membros não satisfeitos com o sistema. Todos os membros são identificados pela meia direita, não posso dizer qual, mas elas tem uma peculiaridade que fazem os membros se reconhecerem.
A ordem se tornou grande em pouco tempo, devido a grande massa insatisfeita com o governo mundial. Mas eu consegui a muito custo que todos os membros fossem leais, era difícil alguém não amigo entrar nela. Escolhi entre os melhores para serem líderes e espalharem a ordem para outro canto. Criei um grupo especializado em assassinatos, um grupo especializado em infiltrações políticas e um grupo de formação de novos cidadãos. Tudo planejado meticulosamente, tudo as escondidas. Hoje tenho membros infiltrados entre os poderosos governantes, creio que em pouco tempo minha ordem será um segundo poder no mundo e terá força para bater de frente com a Colônia. Mas não estaria eu substituindo um poder unitário por outro? Quem duvidar de mim estou em plena disposição de ter meu pescoço degolado.

sexta-feira, 8 de maio de 2009

5 dias e 7 horas

É isso, é o fim. Preciso me acostumar com a idéia. Se me acostumar, o sofrimento será menor. Preciso parar de me mexer também, se bem que não consigo fazer muita coisa mesmo. É estranho como minha mente está fervilhando apesar de meu corpo estar entrando em estado de inanição.
Como foi que eu vim parar aqui mesmo?
Há, foi há alguns dias, eu me lembro fácil agora. Já reconstitui minha pequena história várias vezes, mas sinto que essa será a ultima. Apenas a quantidade de tempo que estou nesse buraco não me lembro ao certo.
Começou assim:
Com uma vontade incrível de sair por aí a esmo e pensar na vida, peguei minha bike e fui dar uma pedalada na serra e, como de costume, fui sozinho. Passei pelas estradas conhecidas e tomei o caminho que passa por umas pastagens já próximas a cidade vizinha. Já estava pedalando há horas e estava bem distraído, nem vi quando um maldito cachorro parou bem na minha frente, só foi o tempo de me desviar e bater com a roda em uma vala e sair rolando pelo chão. Caí a uns cinco metros da bike, o cachorro desapareceu. Só ralei um pouco a perna e o cotovelo direito. Dei dois passos em direção a bike e o chão desabou. Foi um dos momentos mais apavorantes da minha vida, pareceu que eu caia por uma eternidade, esbarrando nas laterais e me machucando bastante, até que dei de encontro com o chão.
Fiquei desacordado por um tempo, não sei quanto, mas quando acordei estava tudo escuro. A primeira coisa que fiz foi tatear meu corpo para ver se tinha lesões, e tinha muitas, e o pior foi constatar que eu quebrara as duas pernas e parece que um braço. Eu não conseguia ficar de pé e nem mexer o braço direito. A segunda coisa que eu fiz foi ficar desesperado. Gritei por socorro por muito tempo, muito tempo mesmo. Até minha voz sumir completamente. Depois eu apaguei de novo.
Quando acordei estava mais calmo, procurei me situar e enxergar minha situação. Havia caído em um poço seco de uma fazenda qualquer. Esse poço era muito fundo, mal podia ver a pouca luz da abertura. Escalar era impossível. Não tinha comida nem água. Só me restava aguardar por ajuda. Alguém certamente veria minha bicicleta lá em cima e aí me acharia. Era o que eu pensava.
Acho que foi no terceiro dia que um terrível desespero se apossou de mim, a situação era insuportável. Eu arranhava a terra ao meu redor até meus dedos sangrarem. Eu tentava gritar, mas em vão. Eu estava faminto também, me lembro de tentar comer terra. Não deu certo. Eu chorava e chorava.
Não tenho muito mais o que lembrar, o tempo passava de forma desordenada e eu ali parado lamentando o terrível infortúnio que me metera. Foi azar eu não ter morrido na queda. Tentei imaginar alguma forma de me matar, mas não tinha coragem e nem muita força para isso.
A dor no corpo já não existe mais. Eu não sinto mais frio ou fome. Ainda, bem lá no fundo, tenho esperanças de que alguém apareça. Mas ainda estou aqui.

segunda-feira, 4 de maio de 2009

Lisboa

Há dias de calmaria nós estamos vivendo. Nem uma leve brisa sopra em nossos rostos carrancudos e agora um pouco preocupados. Os homens andam cambaleando de um lado para outro sem nada para fazer e não podem exagerar na bebida, pois não sabemos até quando ficaremos parados. O mar é belo nessa calmaria, mas é cruel. Como se fosse uma doce virgem escondendo uma agulha envenenada entre seus seios macios.
Rhimus Trades, um novato do mar, ficou louco essa manhã. Jurou que via tigres em todo canto querendo matá-lo. Sabia que nossa incursão a aquelas malditas florestas não nos faria bem. Tivemos que acorrentá-lo em um canto para que não se machucasse, mas a loucura aumentou, ele via as correntes se transformarem em serpentes. Os homens começaram a reclamar de seus gritos. O capitão teve que matá-lo. Ironicamente o capitão tinha um enorme tigre tatuado nas costas.
Mais alguns dias e as lamentações começaram a serem ouvidas. Os velhos lobos culpavam o destino, os mais novos achavam que era castigo divino. Diziam que não devíamos ter matado a tribo de selvagens que encontramos na selva. Eu penso que é só uma questão de sorte e azar. Sobrevivemos um dia, morreremos em outro. Nessas horas de pesares me vem a cabeça a imagem de Lisboa.
A velha Lisboa estava longe ainda, meses à frente. Nosso navio também se chamava LISBOA, talvez isso nos faça sentir mais saudades da terra natal, dos vinhos, das danças, das aventuras nos pomares. Os antigos portos, as antigas casas de cabarés, os mercados abarrotados; tínhamos vários prazeres. Mas hoje nós só temos a calmaria.